quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Capítulo 5


Capítulo 5 – Despedidas

   - Psiu, acorde filho – Serena estava ao lado da cama de Nogard, segurava uma vela pequena em um suporte rústico de madeira -, Nogard vamos, vai se atrasar.
  O garoto acordou parcialmente em meio às sacudidas de sua mãe, piscou e esfregou os olhos, olhou para fora viu que ainda era madrugada e deitou novamente, não quero levantar agora, ainda não é nem manhã, pensou Nogard em meio a bocejos e resmungos.
  - Parabéns pelo seu aniversário meu filho – disse Serena abraçando Nogard.
  - Obrigado mãe – respondeu o garoto ainda de olhos fechados -, vou ganhar algum presente esse ano.
  Serena suspirou.
  - Vai, mas seu presente está com Merlon, vamos levante, ele já deve estar lhe esperando.
  - Ah mãe, não é nem manhã ainda – disse com uma voz preguiçosa e cheia de sono -, Merlon ainda deve estar dormindo, e esta muito frio para sair lá fora e deixar meu cobertor aqui.
  Serena não brigou com ele. Serena também não gritou ou discutiu, ela sabia que Merlon já devia estar acordado e aprontando sua carroça a um bom tempo, porém apenas virou-se e saiu do quarto. Nogard ouviu a porta batendo e se aconchegou sob seu cobertor de couro de cabra, a noite estava particularmente fria, sob seu cobertor ele se sentia abraçado pelo calor, estava tão confortável que podia dormir por dois dias seguidos, porém quando Serena puxou seu cobertor e despejou uma caneca de água fria em suas costas Nogard levantou-se mais rápido do achava que podia.
  Sua mãe não conteve um sorriso.
  - Bom dia cavaleiro, perdoe-me pelo banho mas não teria tempo de aquecer a água e encher a banheira. – Serena disse isso com o sorriso mais terno do mundo nos lábios.
  - Esta bem então. – disse Nogard se apressando para trocar de roupa, afim de amenizar o frio.
  Havia um saco grande de roupas ao lado da porta de entrada, algumas roupas e provisões que Serena aprontara durante a noite, ela sabia que Merlon arcaria com todas as despesas da viagem, mas também sabia que ele era o ferreiro mais pobre de Ferro Forte, e apesar dela também não estar nadando em rios de ouro queria ajudar a sustentar seu filho naquela viagem de negócios.
  - Preste atenção a tudo que Merlon fizer e disser, nesse ramo é importante entender aquilo que o comprador deseja, se algum homem deseja um escudo de pano você o faz, você não argumenta ou diz que será frágil, você apenas o faz, faça amizade com os homens de armas que estarão por lá e sempre diga que é de Ferro Forte, entendeu? – explicou Serena arrumando o saco de provisões nas costas de Nogard, que se queixava do peso.
  - Sim mãe. – disse Nogard virando os olhos, abriu a porta – Merlon vai me ensinar tudo, tenho certeza.
  Serena o olhou com ar de desconfiança, Nogard não gostava da ideia de ser um ferreiro e Serena sabia disso, mas decidiu não dizer nada, era cedo demais e Nogard carregava muito peso para um garoto. Abaixou sobre um joelho e beijou a testa do filho, um beijo longo e amoroso que revelava todo seu receio, abraçou Nogard com tanta força que o garoto engasgou.
  - Eu te amo, e que os Dragões te guiem.
  - Eu também te amo mãe, eu vou caminhar nas sombras de suas asas.
  Nogard saiu por entre as vielas da vila dos ferreiros, deixou sua mãe para trás com uma vela trêmula, numa noite escura e fria, não queria olhar para trás pois sabia que sua mãe estaria chorando ou viria até ele cancelando aquela coisa toda, não se preocupe mãe, vou me tornar um cavaleiro e vou salvar o reino, trarei presentes e ouro para a senhora, eu juro, prometeu e jurou o garoto. Um juramento de criança, mas que não valia menos que um juramento de um adulto. Pelo menos para Nogard, filho de Bemiron, o Grão Arqueiro.
  A subida foi longa, a noite fria drenava suas forças e o saco pesava a cada passo, enfim viu a longa carroça de Merlon, já estava carregada e coberta com uma grossa lona, pelo menos frio ela não vai sentir, pensou o garoto, que já sabia que Arwen estava ali, escondida em meio às lanças e espadas. Nogard jogou seu saco no chão e olhou para Merlon.
  - Posso expl...
  - Não precisa se explicar jovem, você não é obrigado a ir trabalhar – disse Merlon, referindo-se à falta de Nogard ao trabalho no dia anterior -, sei que não fez por mal, vamos me dê aqui esta saco, vou coloca-lo com as lanças.
  Nogard congelou, evidentemente que não pelo frio, mas pelo fato de que Merlon poderia descobrir Arwen ali, provavelmente Merlon havia aprontado a carroça a algum tempo e Arwen se esgueirou para dentro dela depois que o velho ferreiro foi pegar os cavalos.
  - Não há necessidade meu senhor – disse Nogard segurando firmemente a corda do saco -, eu faço questão de levar no banco de condução. – e sorriu com ternura.
  Merlon coçou a barba, aquilo era mais um cacoete, que uma demonstração de reflexão.
  - Tudo certo então, assim seja, podemos ir enfim? Ou falta algo ainda?
  Nogard colocou o saco no banco de condução, não sem muita dificuldade, e sentou-se. Os cavalos de Merlon eram dois garanhões brancos, magros e feios, eram os cavalos de guerra de Merlon, mas a muito tempo não guerreavam, nem mesmo puxavam tanto peso.
  Merlon sentou-se ao lado do jovem, acendeu seu cachimbo e lambeu o dorso dos cavalos com as rédeas, no mesmo instante os cavalos começaram a se mover, e Nogard teve uma certeza, agora começa a minha aventura.
  - Senhor Merlon, minha mãe me disse que você tinha um presente para mim, posso vê-lo?
  Merlon sorriu com o cachimbo na boca, deu uma baforada lenta e continua.
  - Seu presente está em Pescoço, existe um homem lá chamado Jih’ndo, quando chegarmos ele lhe dará seu presente.
  Passaram pela baixa cerca de madeira que representava os limites da vila, a sua frente havia um enorme campo de trigo, e depois altas colinas verdes, e aquilo que Nogard podia ver da vila, aquilo que ele viu desde criança, as muralhas de Pescoço dos Homens.
  - Tem razão Decadência, não poderia deixar isso acontecer, não, seria uma tristeza para todos nós, ora é claro que vou fazer algo, acha que sou um assassino de crianças? – conversaram mais uma vez Merlon e sua inseparável cicatriz.
  Nogard não lhe deu atenção, estava perdido em pensamentos, imaginava como seria Pescoço dos Homens por dentro, suas muralhas eram altas e cinzentas, mas a verdadeira cidade não era apenas uma muralha, ali dentro viviam milhares de pessoas, e dentre todas, aquelas que Nogard mais queria conhecer, os Cavaleiros do Rei.
  - Jovem, cuidado com as costas, essas lanças estão bem afiadas, eu mesmo as afiei e posso garantir isso, a ultima coisa que queremos é uma criança ferida nessa viagem não?.
  Nogard passou a mão no encosto do banco de condução e não sentiu ponta alguma.
  - Não estou sentindo nada aqui. – respondeu ainda tateando o encosto.
  - Ora pare de ser bobo garoto, não estou falando com você, estou falando com a garota que esta escondida na bagagem. – disse Merlon sem tirar os olhos da estrada. – E espero, para o bem de vocês, que ela tenha trazido alguma coisa doce para nós comermos na viagem.