quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Capítulo 12

 Capítulo 12 – Um Segundo Presente

   Será que poderei ajuda-los? Pensou Arwen, parada sob o arco do portão, trazia uma pequena jarra nas mãos, estava cheia de uma mistura contra queimaduras que ela havia preparado a mando de Merlon. Arwen pensava que haveriam feridos, de fato ouvira falar das chamas do Vergonha da Família, mas aquilo que ela viu foi algo diferente, foi algo assustador e impressionante.
  Os céus eram uma mistura de negro, vermelho e cinza. O solo estava repleto de flechas e lanças queimadas, havia homens, cavalos e garotos, jovem escudeiros,  deitados no solo, aqueles que estavam imóveis não veriam o amanhã, foram beijados pelas chamas do Dragão e nada deles restou alem de sonhos inacabados e memórias. Arwen foi caminhando em direção ao campo, o solo parecia querer ceder, o calor ainda era sentido através do calçado, a jarra não estava pesada, mas parecia, os corpos que não se moviam partiam o coração da garota, mas aqueles que se moviam partiam-lhe a alma, gritos de agonia e lamentos eram ouvidos por toda a extensão do campo. Muitas mulheres começaram a sair da cidade, mas nenhuma delas trazia jarros de medicinas, não traziam água nem alimentos, elas traziam lágrimas e saudades.
  Não havia mais sons dos sinos e das trombetas da cidade, a ameaça se fora, os Cavaleiros da Cidade fizeram sua parte, protegeram sua cidade, suas mulheres e crianças, havia uma vitória mascarada naquela dor, uma vitória pequena, sobre um mau que crescia e se tornava cada vez maior dia após dia.
  Arwen abaixou-se para começar a tratar o primeiro ferido, um jovem Cavaleiro, não tinha mais cabelos e sua armadura estava tão quente que Arwen não pode toca-la, ele a olhou e tentou dizer algo mas a garota o interrompeu com um sorriso.
  - Eu sei, eu sei bravo cavaleiro, todos sabemos que você deu o seu melhor – os olhos de Arwen derramaram algumas lágrimas -, mas sua jornada ainda não terminou, deixe-me ajudá-lo. – E passou a mistura em seus braços, a feição do Cavaleiro mudou completamente, suspirou de alivio e pode voltar a respirar novamente.
  As misturas Bolkurianas eram conhecidas em toda a Andor, uma arte roubada dos Banedúim, assim como a magia e a terra em si.
  Arwen passou a mistura em todos aqueles que ainda respiravam, até que não houvesse mais mistura no jarro, então ela viu na extremidade oposta do campo, os longos cabelos dourados de Renolon ao vento, a seus pés, ajoelhados, estavam Merlon, Lorde Grum, e Nogard, deitado no solo, imóvel.
  A garota correu sem pensar, mais lágrimas molharam-lhe o rosto, o campo continuava  fumaçando como uma enorme fogueira amanhecida.
  Nogard estava deitado de costas, saía sangue de seus ouvidos, e seu cavalo batia uma pata insistentemente no solo ao lado do garoto, Arkas está preocupado, pensou a garota.
  - O que houve? O Dragão o atacou? Por que vocês não o defenderam? Como ele chegou aqui? – as perguntas vieram em meio ás lágrimas, Arwen ajoelhou-se ao lado de Merlon e afastou uma mecha de cabelo do rosto de Nogard – Ele era meu.... eu devia ter... eu o....
  - Não há nada de errado com o garoto Arwen – interrompeu Merlon antes que Arwen dissesse algo que estava além do entendimento dos ali presentes -, pelo contrário, ele salvou a todos.
  Lorde Grum deu uma fungadela de desdém.
  - Então por que ele não se move?
  Nogard permanecia deitado, imóvel, tinha os olhos completamente abertos, seus olhos estavam cheios de lágrimas mas mesmo inconsciente o garoto se recusava a chorar.
  - A presença do Dragão causa isso às vezes, Arwen. – disse Renolon, que tinha as mãos queimadas devido ao escudo - Este tipo de animal é do inicio dos tempos, e nele residem mais mistérios do que os homens podem imaginar.
  Arwen ficou mais aliviada, e um pouco constrangida pelo que havia dito, ou quase dito.
  Então Nogard piscou os olhos, acordou sem saber o que se passava ao redor, e mesmo depois que Merlon explicou a situação ainda parecia meio confuso.
  - Bem, creio que esses palermas não lutavam a anos, não tinham chance alguma contra a fera, e nós Ponta Lancenses eramos apenas dez, digam o que quiser, mas Andor não será páreo para mais uma invasão do sul, ainda me lembro da ultima e jamais vi tamanho desafio. – disse o gordo e forte Lorde Grum.
  - Deveria respeitar os mortos, Castelão. – disse Renolon, ofendido pelas palavras do Lorde de Pontas de Lança.
  - Perdoe-me, majestade, não quero ser envenenado como seu irmão, pode ficar com o meu posto. – disse Grum, falando de Arelon e sua doença, fez uma reverencia que encheu Renolon de ódio.
  - O que esta insinuando? – disse Renolon perdendo a cabeça, tocou o punho de sua espada – Mostre-me seu aço...
  - Basta! – disse Merlon pondo-se de pé – Vocês são todos iguais, lutam entre si enquanto partilham de um inimigo em comum, olhem para trás, não vejo moradores do sul aqui nesses campos, e quando a hora chegar se não se unirem de uma vez por todas e esquecerem todos esses Senhores, Lordes e Reis, nada restará de Andor. Grum você tem razão não existem soldados tão bem treinados quanto os Ponta Lancenses.
  - Exatam... – começou a se gabar Lorde Grum.
  Mas foi interrompido por Merlon.
  - Por isso deverá levar Nogard consigo para o norte, para treiná-lo e prepará-lo, para o pior.
  Lorde Grum virou a cabeça e cuspiu.
  - E o que faz você pensar que eu o aceitarei?
  - Eu! – disse Jih’ndo, se aproximando – Não é hora para discussões, precisamos ajudar os feridos, Lorde Grum você levará o garoto. – Nogard e Arwen começaram a entender que ficariam longe um do outro – Mas por hora sua presença é requisitada na ajuda aos feridos. – disse Jih’ndo convidando o Lorde Jeh’khgari a se retirar dali o quanto antes.
  Grum não se abateu, aproximou seu rosto de Nogard. Merlon tocou Mitrhiilden. O Lorde olhou nos olhos do garoto, que crescia rapidamente dia após dia.
  - Vou aceitá-lo, até que morra ou até que encontre alguém melhor que você. – bateu os calcanhares e partiu com seus dez guerreiros.
  - E é por isso minha jovem – disse Jih’ndo a Arwen, quando o Lorde se afastou -, que os Ponta Lancenses se casam com suas lanças, são péssimos de se conviver, mas são úteis em batalha.
  Arwen pegou-se pensando em uma questão, e perguntou sem pensar.
  - E você? Também não é casado senhor Jih’ndo? – Merlon e Renolon trocaram olhares desconfortáveis e Nogard ainda não acreditava que havia enfrentado um Dragão.
  O Jeh’khgari sorriu abertamente, seus dentes eram brancos e bonitos.
  - E por que você acha que eu sou um dos homens mais ricos de Andor minha cara Arwen? – Arwen não entendeu a resposta mas achou melhor ficar quieta. Jih’ndo chamou seu criado, aquele de vestes brancas e muito magro, e pegou um embrulho de couro – Nogard, eis aqui o seu presente, não posso lhe dar muitas informações sobre esta lâmina, afinal não a conheço, apenas sei que esta é uma das espadas mágicas Banedúim, foi encontrada sob o leito de um grande Maégi, no final da Era das Conquistas Jeh’khgari, tome é sua. – e estendeu o embrulho ao garoto.
  Nogard pegou a espada e retirou-a da bainha, a espada era leve como uma pena, possuía uma lâmina comprida porém estreita, era levemente curvada na ponta e parecia tão afiada quanto podia estar, sua lâmina era fina, possuía um guarda mão dourado e seu pomo era composto por um cristal pontiagudo, mas o que mais chamou a atenção de Nogard e de todos os outros, era sua lâmina em si, era feita de um material semelhante ao barro e a lama, e era tão amarronzada quanto, Nogard teve medo de golpear com a lâmina e quebrá-la como um velho pote de mel. Bateu algumas vezes com a ponta no solo, temeroso.
  - Não se preocupe, ela não é nada frágil, tenha a bondade. – disse Jih’ndo apontando um pequeno arbusto, que estava completamente queimado pelas chamas de Lutheraxes.
  Nogard golpeou o tronco e os galhos, e o corte foi tão suave e silencioso quanto um sopro.
  Minha espada, agora não preciso de mais nada para ser um Cavaleiro, pensou o garoto.
  - Como se chama? – perguntou Nogard.
  Jih’ndo deu de ombros.
  - Não sei, como te disse não conheço muito dessa lâmina.
  - Merlon disse que se deve conhecer sua arma. – disse o garoto, para a surpresa do velho.
  - Muito bem Nogard, e isso é verdade, creio que terá tempo suficiente em Pontas de Lanças para descobrir tudo sobre ela, pois permanecerá lá durante longos seis meses.
  Agora não havia mais volta.
  - E minha mãe? – perguntou Nogard, tentando ser evasivo.
  - Já esta ciente, mesmo antes de sairmos de Ferro Forte.
  Nogard não sabia o que era mais espantoso, o fato de que sua mãe sabia disso tudo desde o inicio ou o fato de Arwen estar tão vermelha de raiva a ponto de espancar todos ali.
  - Desculpe Merlon – disse o garoto -, mas não posso aceitar. – e atirou a espada e a bainha ao solo.
  O velho abaixou-se e recolheu a bainha, limpou as cinzas que se prenderam na madeira e encarou
Nogard, sua sobrancelha estava erguida novamente.
  - E posso saber o motivo, senhor? – perguntou Merlon.
  Nogard fitou Arwen e sorriu.
  - Não se deve esquecer do passado não é mesmo, e Arwen esta comigo desde sempre, não posso abandoná-la.
  Renolon sorriu amigavelmente e cruzou os braços encarando Merlon.
  - Já pensei nisso meu jovem – disse Jih’ndo -, irei com vocês para Pontas de Lança, e Arwen irá como minha sobrinha.
  Nogard ganhou um sorriso de Arwen.
  - Então irei. – disse o garoto e deu de ombros.
  Então sentiu a bainha de madeira de sua recém adquirida espada na cabeça, Merlon bateu com força e vontade, com força até demais talvez.
  - E isso é para que aprenda a nunca jogar sua espada onde não deve.
  Todos teriam rido da situação, mas ainda havia muitos feridos nos campos. Quando todos foram resgatados e cuidados, e os mortos enterrados com seus devido respeitos, a noite já caia sobre Andor, eles voltaram para dentro da cidade, sujos e cansados, Merlon fez questão de ser o ultimo a entrar, mais a frente seguiam Nogard e Arwen, lado a lado conversando, Arkas passeava ao lado dos dois, como se guardasse o garoto a todo momento. Nogard trazia sua nova espada presa ao cinto, sua lâmina era tão comprida que tocava a rua.
  - Obrigado pelo que fez por mim, Nog. – disse Arwen.
  - Não preciso dizer que você faria o mesmo por mim, pois sei que faria.
  - E então, você tem uma espada, e ela não tem um nome, como vai chama-la? – Perguntou Arwen.
  Nogard olhou para os céus, não havia estrelas, as sombras não as deixavam aparecer a um longo tempo, lembrou-se quando deitava sobre o telhado de Pátio dos Arqueiros, em Ferro Forte, olhando as estrelas com sua mãe, parecia que haviam se passado mil anos, então o garoto ficou sério, olhou para o cabo de sua nova lâmina, o diamante brilhava à luz dos archotes da rua.
  - Se chamará Luxímera. A Estrela na Escuridão, e enquanto eu a possuir as sombras irão desmoronar, eu prometo.


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